30 de jun. de 2011

Meu chão eu fiz de mola...


Eu vou nomeando meus sonhos um por um. Colocando metas, fazendo projetos, com os dedos cruzados e minhas melhores vibrações.
Claro que eu me frustro, faz parte da vida... Mas, meu chão eu fiz de mola. Posso cair todos os dias, mas o resultado da minha queda é o impulso.

Fernanda Gaona

24 de jun. de 2011

Eu preciso aprender a ser menos

Eu preciso aprender a ser menos. Menos dramática. Menos intensa. Menos exagerada. Alguém já desejou isso na vida: ser menos? Pois é. Estranho. Mas eu preciso.
Nesse minuto, nesse segundo, por favor, me bloqueie o coração, me cale o pensamento, me dê uma droga forte para tranqüilizar a alma. Porque eu preciso. E preciso muito.
Eu preciso diminuir o ritmo, abaixar o volume, andar na velocidade permitida, não atropelar quem chega, não tropeçar em mim mesma. Eu preciso respirar. Me aperte o pause, me deixe em stand by, eu não dou conta do meu coração que quer muito. Eu preciso desatar o nó. Eu preciso sentir menos, sonhar menos, amar menos, sofrer menos ainda. Aonde está a placa de PARE bem no meio da minha frase?
Confesso: eu não consigo. Nada em mim pára, nada em mim é morno, nada é pouco, não existe sinal vermelho no meu caminho que se abre e me chama. E eu vou... Com o coração na mochila, o lápis borrado, o sorriso e a dúvida, a coragem e o medo, mas vou...
Não digo: "estou indo", não digo: "daqui a pouco", nada tem hora a não ser agora. Existe aí algum remedinho para não-sentir? Existe alguma terapia, acupuntura, pedras, cores e aromas para me calar a alma e deixar mudo o pensamento?
Quer saber? Existe. Existe e eu preciso. Preciso e não quero.

Fernanda Mello

23 de jun. de 2011

A gente cai muito quando tem correndo nas veias a sinceridade



Tem dias que é preciso vestir a roupa de adulto e atravessar a rua segurando bem forte a mão da vida. Não dá para se esconder ou fugir. Defino assim: crianças fogem, adultos encaram. Criança foge do escuro e acende a luz. Foge do medo e pula no colo da mãe. Foge do castigo e mostra a língua para o irmão, implicando. Adulto tem que encarar, a gente aprende desde cedo que fugir é feio, ruim. Fugir é infantil. Por isso, todo adulto é forçado a aguentar, dormir, acordar e continuar.

Acho que todo mundo precisa de esconderijo. Não fujo, mas vez em quando me escondo porque preciso da minha paz, preciso ler minhas frases silenciosas. Palavra pra mim é a coisa mais séria e bonita que existe. Preciso delas ao meu lado, sublinhadas. Tenho esse lado infantil de correr para o colo da mãe, acender a luz do corredor e não caminhar no escuro. Gosto da luz, do mundo claro. Em compensação, amo noites e estrelas.

Esqueci de crescer em um aspecto: sou muito boa para quem eu gosto. Para esses, o mundo. Amo abraços, dar presentes, fazer agrados, segurar a mão, o coração, segurar a barra. Quando eu gosto me entrego demais. Quem eu levo comigo, entenda, levo no peito, num duplex com vista para o mar. Mas nem todo mundo é santo, muito menos eu. Sei ser suja e má: por favor, não pague para ver. O preço é alto, eu faço birra, bato o pé, fico de bico. Fica escrito na minha cara: eu gosto/não gosto de você – não sei disfarçar.

Sou franca e falo o que penso, deve ser por isso que vivo com os joelhos roxos. A gente cai muito quando tem correndo nas veias a sinceridade. Nem sempre sei a hora de falar as coisas, em contrapartida nem sempre eu falo tudo. Será que você entende? Tenho medo de ferir com as palavras. Na verdade, morro de medo disso. Então, eu fico escondendo de você que às vezes faz um frio danado aqui dentro.

Clarissa Corrêa

O imprevisto me fascina


"A praia estava cheia de um vento bom, de uma liberdade. E eu estava só. E naqueles momentos não precisava de ninguém. Preciso aprender a não precisar de ninguém. É difícil, porque preciso repartir com alguém o que sinto. O mar estava calmo. Eu também. Mas à espreita, em suspeita. Como se essa calma não pudesse durar. Algo está sempre por acontecer. 
O imprevisto me fascina.
"

Clarice Lispector

22 de jun. de 2011

Sentimentos


"Somos donos de nossos atos,
mas não donos de nossos sentimentos;
Somos culpados pelo que fazemos,
mas não somos culpados pelo que sentimos;
Podemos prometer atos,
mas não podemos prometer sentimentos...
Atos são pássaros engaiolados, sentimentos são pássaros em vôo."

Mário Quintana

Ela sabia que precisava dele


"Ela sabia que precisava dele. Pelo menos naquela noite chuvosa e sem grandes esperanças. Mas tinha medo da compulsão. De querer ele sempre e sempre e pra sempre. E amanhã e depois. E de dia, e tarde, de madrugada. E não saber digerir tanto amor e tanto amor acabar lhe fazendo mal. Só mais um pouquinho, pensou. Uma lasquinha. Pra dormir feliz. Amanhã era amanhã. Depois ela resolvia...”

Tati Bernardi

21 de jun. de 2011

"Quantas vezes tentaram adivinhar o que sentíamos, e erraram. Julgaram nossas ações, e erraram. Tiveram certeza sobre nossos propósitos, erraram. O que somos de verdade e o que queremos de fato, só nós sabemos. Só nós."


Martha Medeiros

No extremo dos limite e das sensações


Tenho uma simplicidade enorme e um coração generoso mas, existe também um lado "pavio curto" e inconstante. E eu só sei viver assim, no extremo do limite e das sensações.


E.Ikuno

20 de jun. de 2011

Crônica de Martha Medeiros

Depois de um bom tempo dizendo que eu era a mulher da vida dele, um belo dia eu recebo um e-mail dizendo: ‘olha, não dá mais’.
Tá certo  que a gente tava quase se matando e que o namoro já tinha
acabado  mesmo, mas não se termina nenhuma história de amor (e eu
ainda o amava muito) com um e-mail, não é mesmo? Liguei pra tentar
conversar e terminar tudo decentemente e ele respondeu: mas agora eu to comendo um
lanche com amigos’. Enfim, fiquei pra morrer algumas semanas até que
decidi que precisava ser uma mulher melhor para ele. Quem sabe eu
ficando mais bonita, mais equilibrada ou mais inteligente, ele não
volta pra mim?
Foi assim que me matriculei simultaneamente numa academia de ginástica, num centro budista e em um curso de cinema.


Nos meses que se seguiram eu me tornei dos seres mais malhados, calmos,espiritualizados e cinéfilos do planeta. E sabe o que aconteceu? Nada, absolutamente nada, ele continuou não lembrando que eu existia.
Aí achei que isso não podia ficar assim, de jeito nenhum, eu precisava
ser ainda melhor pra ele, sim, ele tinha que voltar pra mim de qualquer jeito!
Pra isso, larguei de vez a propaganda, que eu não suportava mais, e
resolvi me empenhar na carreira de escritora, participei de vários
livros, terminei meu próprio livro, ganhei novas colunas em revistas,
quintupliquei o número de leitores do meu site e nada aconteceu.



Mas eu sou taurina com ascendente em áries, lua em gêmeos, filha única! Eu
não desisto fácil assim de um amor, e então resolvi tinha que ser uma
super ultra mulher para ele, só assim ele voltaria pra mim.
Foi então que passei 35 dias na Europa, exclusivamente em minha
companhia, conhecendo lugares geniais, controlando meu pânico em estar
sozinha e longe de casa, me tornando mais culta e vivida. Voltei de
viagem e tchân, tchân, tchân, tchân: nem sinal de vida.


Comecei um documentário com um grande amigo, aprendi a fazer strip, cortei meu cabelo 145 vezes, aumentei a terapia, li mais uns 30 livros, ajudei os pobres, rezei pra Santo Antonio umas 1.000 vezes, torrei no sol, fiz milhares de cursos de roteiro, astrologia e história, aprendi a nadar, me apaixonei por praia, comprei todas as roupas mais lindas de Paris.

Como última cartada para ser a melhor mulher do planeta, eu resolvi ir
morar sozinha. Aluguei um apartamento charmoso, decorei tudo
brilhantemente, chamei amigos para a inauguração, servi bom vinho e
comidinhas feitas, claro, por mim, que também finalmente aprendi a
cozinhar. Resultado disso tudo:  silêncio absoluto.

O tempo passou, eu continuei acordando e indo dormir todos os dias querendo ser mais feliz para ele, mais bonita para ele, mais mulher para ele.
Até que algo sensacional aconteceu…

Um belo dia eu acordei tão bonita, tão feliz, tão realizada, tão
mulher, que eu acabei me tornando mulher DEMAIS para ele. Ele quem
mesmo???
Martha Medeiros 

Fofocas



Quem faz intrigas sobre a vida alheia quer ter algo de sua autoria, uma obra que se alastre e cresça, que se torne pública e que seja muito comentada. Algo que lhe dê continuidade. É por isso que, fofocar é uma tentação. Porque nos dá, por poucos minutos, a sensação de ser portador de uma informação valiosa que está sendo gentilmente dividida com os outros. Na verdade, está se exercitando uma pequena maldade, não prevista no Código Penal.

Fofocas podem provocar lesões emocionais. Por mais inocente ou absurda, sempre deixa um rastro de desconfiança. Onde há fumaça há fogo, acreditam todos, o que transforma toda fofoca numa verdade em potencial. Não há fofoca que compense. Se for mesmo verdade, é uma bala perdida. Se for mentira, é um tiro pelas costas...

E.Ikuno

18 de jun. de 2011



Não há lugar para onde correr: as mudanças, quando precisam acontecer, sabem como nos encontrar.


Ana Jácomo

17 de jun. de 2011

Meu tempo não se mede em relógios. E a vida lá fora, me chama!

Ela também teve seu coração machucado. Dilacerado, imagino. Normal. Desse mal, meu bem, ninguém escapa. Mas o bom disso tudo é que agora consigo abrir meu coração sem rodeios.
Sim, amei sem limites. Dei meu coração de bandeja. Sim, sonhei com casinhas, jardins e filhos lindos correndo atrás de mim. Mas tudo está bem agora, eu digo: agora. Houve uma mudança de planos e eu me sinto incrivelmente leve e feliz.
Descobri tantas coisas. Existe tanta coisa mais importante nessa vida que sofrer por amor. Que viver um amor. Tantos amigos. Tantos lugares. Tantas frases, livros e sentidos. Tantas pessoas novas. Indo. Vindo.
Tenho só um mundo pela frente. E olhe pra ele. Olhe o mundo! É tão pequeno diante de tudo o que sinto. Sofrer dói. Dói e não é pouco. Mas faz um bem danado depois que passa.
Descobri, ou melhor, aceitei: eu nunca vou esquecer o que passei. Nunca. Mas agora, com sua licença. Não dá mais para ocupar o mesmo espaço. Meu tempo não se mede em relógios. E a vida lá fora, me chama!”


Fernanda Mello

16 de jun. de 2011


"E quando ele riu, eu percebi. Eu percebi que eu estava na merda."


Tati Bernardi

15 de jun. de 2011

Toda mulher é doida


Toda mulher é doida. Impossível não ser.
A gente nasce com um dispositivo interno que nos informa desde cedo que, sem amor, a vida não vale a pena ser vivida, e dá-lhe usar o nosso poder de sedução para encontrar The Big One, aquele que será inteligente, másculo, se importará com nossos sentimentos e não nos deixará na mão jamais. Uma tarefa que dá pra ocupar uma vida, não é mesmo?
Mas, além disso, temos que ser independentes, bonitas, ter filhos e fingir de vez em quando que somos santas, ajuizadas, responsáveis, e que nunca, mas nunca, pensaremos em jogar tudo pro alto e embarcar num navio pirata comandado pelo Johnny Depp, ou então virar loura e cafetina, ou sei lá, diga aí uma fantasia secreta, sua imaginação deve ser melhor que a minha.
Eu só conheço mulher louca. Pense em qualquer uma que você conhece e me diga se ela não tem ao menos três dessas qualificações: exagerada, dramática, verborrágica, maníaca, fantasiosa, apaixonada, delirante. Pois então. Também é louca. E fascina a todos. Nossa insanidade tem nome, chama-se: Vontade de viver até a última gota. Só as cansadas é que se recusam a levantar da cadeira para ver quem está chamando lá fora. E santa, fica combinado, não existe. Uma mulher que só reze, que tenha desistido dos prazeres da inquietude, que não deseje mais nada? Você vai concordar comigo: só se for louca de pedra.



14 de jun. de 2011


"Oh, que divertido vai ser quando me virem aqui no outro lado do espelho e não puderem me agarrar!” 

Lewis Carroll em: Alice no País dos Espelhos.

11 de jun. de 2011

Não custa nada tentar



O meu amor é unilateral, mas eu não me importo mais.
Eu sigo em frente, pra frente eu vou.
Eu sigo enfrentando a onda onde muita gente naufragou.
Vou navegar. Quem sabe exista amor escondido do outro lado.
Não custa nada tentar.

Rodrigo Tavares

10 de jun. de 2011

Das distâncias


“Eu escrevo teu nome nessas pedras, que vou jogando por onde passo. No fundo, espero que você me siga, mas não tenho coragem de pedir. Aí, tem gente que vem, sem nem ser chamado, sem nem se importar com o fato do nome escrito ali, ser outro. As pessoas não ligam pra essas pequenezas, sabe? Eu ligo. Ligo pra tudo. Sou mais de detalhes, que do todo. Sempre fui. O fato é que fico olhando pra trás pra ver se você tá vindo e já tropecei umas quantas vezes. Esses dias mais. Isso porque não sinto teu cheiro no ar, não ouço o teu riso passeando pelas horas. E sinto falta. E sinto um quase-medo. Embora, não tenha a menor idéia de quê. Sabe quando você pressente o monstro no escuro, mesmo sem poder vê-lo? É assim. Não sei se você entende, não sei se alguém entende e, realmente, não me importo. Não me importo mais com um monte de coisas. Dos benefícios do tempo. Hoje, parei e sentei bem aqui na beira desse rio que me atravessa. Só pra te pensar bem forte e te fazer sentir amor do lado de lá. Sim, porque você ainda não atravessou a ponte, bem sei. Mas, ando me sentindo fraca e cansada. Tenho andado demais, jogado pedras demais, esperado demais e você não me alcança. Talvez, seja melhor mergulhar e afogar os pensamentos. Espero que você consiga chegar a tempo e salvar os mais bonitos.”

Briza Mulatinho

9 de jun. de 2011

Perseverança

Jogo a minha rede no mar da vida e às vezes, quando a recolho, descubro que ela retorna vazia. Não há como não me entristecer e não há como desistir. Deixo a lágrima correr, vinda das ondas que me renovam, por dentro, em silêncio: dor que não verte, envenena. O coração marejado arrumo, como posso, os meus sentimentos. Passo a limpo os meus sonhos. Ajeito, da melhor forma que sei a força que me move. Guardo a minha rede e deixo o dia dormir.

Com toda a tristeza pelas redes que voltam vazias, sou corajosa o bastante para não me acostumar com essa idéia. Se gente não fosse feita pra ser feliz, Deus não teria caprichado tanto nos detalhes. Perseverança não é somente acreditar na própria rede. Perseverança é não deixar de crer na capacidade de renovação das águas.

Hoje, o dia pode não ter sido bom, mas amanhã será outro mar. E eu estarei lá na beira da praia de novo. "

Ana Jácomo
"Há um pássaro azul no meu coração que quer sair mas eu sou demasiado duro com ele, e digo, fica aí dentro, não vou deixar
ninguém ver-te.
Há um pássaro azul no meu coração que quer sair mas eu despejo whisky para cima dele e inalo fumaça de cigarros e, as putas e os empregados de bar e os funcionários da mercearia nunca saberão que ele se encontra lá dentro.
Há um pássaro azul no meu coração que quer sair mas eu sou demasiado duro com ele, e digo, fica escondido, queres arruinar-me? queres foder o meu trabalho? queres arruinar as minhas vendas de livros na Europa?
Há um pássaro azul no meu coração que quer sair mas eu sou demasiado esperto, só o deixo sair à noite por vezes quando todos estão a dormir.
Digo-lhe, eu sei que estás aí, por isso não estejas triste. Depois, coloco-o de volta, mas ele canta um pouco lá dentro,
não o deixei morrer de todo e dormimos juntos assim com o nosso pacto secreto e é bom o suficiente para fazer um homem chorar, mas eu não choro, e tu?"

Charles Bukowski

Se eu pudesse voltar atrás no tempo...

Sei lá... Me deu vontade de escrever uma carta. Pegar papel, caneta, colocar sobre a mesa. Fazer letra bonita, bem desenhada. Pra que quando seus olhos corressem sobre as linhas, visse que dentro de mim ainda havia beleza. Pra que quando você abrisse aquela carta descobrisse que sou além de letras criadas. Eu existo. Escrevia com calma. Dizendo sobre tudo que sentia. Contei sobre aquilo que frente a frente jamais conseguiria. Na metade, parei. Debrucei sobre a folha, que já se borrava. Fiquei me perguntado: até quando? Respirei por uns minutos, entre goles engasgados de raiva. Ao terminá-la, dobrei com cuidado. Processo demorado de decisão. Ia, ou não ia? Decidi ir.
No verso do envelope, escrevi: “Para um criminoso”, pois quando lesse aquela carta, talvez eu não estivesse ali. Mas só aí então, entenderia que além do meu coração, havia roubado minha paz, meus sonhos, minha vida! E eu não te dou esse direito. Ah! Se eu pudesse voltar atrás no tempo.

Patty Vicensotti



7 de jun. de 2011

"São os olhos, exatamente os olhos, que eu mais ouço. A vida tem me ensinado, ao longo da jornada, que as palavras muitas vezes mentem. 
Os olhos, geralmente, não desmentem o que diz o coração.” 

6 de jun. de 2011

Anjos

A vida tem me forçado a começar a acreditar em anjos.

Se não for exatamente esse o recado, ela certamente está tentando me fazer (re)começar a acreditar. Simplesmente. No que quer que seja. (e isso talvez, por enquanto, me seja o suficiente). 

4 de jun. de 2011

Vai passar

Vai passar, tu sabes que vai passar. Talvez não amanhã, mas dentro de uma semana, um mês ou dois, quem sabe? O verão está ai, haverá sol quase todos os dias, e sempre resta essa coisa chamada "impulso vital". Pois esse impulso às vezes cruel, porque não permite que nenhuma dor insista por muito tempo, te empurrará quem sabe para o sol, para o mar, para uma nova estrada qualquer e, de repente, no meio de uma frase ou de um movimento te supreenderás pensando algo como "estou contente outra vez". Ou simplesmente "continuo", porque já não temos mais idade para, dramaticamente, usarmos palavras grandiloqüentes como "sempre" ou "nunca". Ninguém sabe como, mas aos poucos fomos aprendendo sobre a continuidade da vida, das pessoas e das coisas. Já não tentamos o suicidio nem cometemos gestos tresloucados. Alguns, sim - nós, não. Contidamente, continuamos. E substituimos expressões fatais como "não resistirei" por outras mais mansas, como "sei que vai passar". Esse o nosso jeito de continuar, o mais eficiente e também o mais cômodo, porque não implica em decisões, apenas em paciência.
Claro que no começo não terás sono ou dormirás demais. Fumarás muito, também, e talvez até mesmo te permitas tomar alguns desses comprimidos para disfarçar a dor. Claro que no começo, pouco depois de acordar, olhando à tua volta a paisagem de todo dia, sentirás atravessada não sabes se na garganta ou no peito ou na mente - e não importa - essa coisa que chamarás com cuidado, de "uma ausência". E haverá momentos em que esse osso duro se transformará numa espécie de coroa de arame farpado sobre tua cabeça, em garras, ratoeira e tenazes no teu coração. Atravessarás o dia fazendo coisas como tirar a poeira de livros antigos e velhos discos, como se não houvesse nada mais importante a fazer. E caminharás devagar pela casa, molhando as plantas e abrindo janelas para que sopre esse vento que deve levar embora memórias e cansaços.
Contarás nos dedos os dias que faltam para que termine o ano, não são muitos, pensarás com alívio. E morbidamente talvez enumeres todas as vezes que a loucura, a morte, a fome, a doença, a violência e o desespero roçaram teus ombros e os de teus amigos. Serão tantas que desistirás de contar. Então fingirás - aplicadamente, fingirás acreditar que no próximo ano tudo será diferente, que as coisas sempre se renovam. Embora saibas que há perdas realmente irreparáveis e que um braço amputado jamais se reconstituirá sozinho. Achando graça, pensarás com inveja na largatixa, regenerando sua própria cauda cortada. Mas no espelho cru, os teus olhos já não acham graça.
Tão longe ficou o tempo, esse, e pensarás, no tempo, naquele, e sentirás uma vontade absurda de tomar atitudes como voltar para a casa de teus avós ou teus pais ou tomar um trem para um lugar desconhecido ou telefonar para um número qualquer (e contar, contar, contar) ou escrever uma carta tão desesperada que alguém se compadeça de ti e corra a te socorrer com chás e bolos, ajeitando as cobertas à tua volta e limpando o suor frio de tua testa.
Já não é tempo de desesperos. Refreias quase seguro as vontades impossíveis. Depois repetes, muitas vezes, como quem masca, ruminas uma frase escrita faz algum tempo. Qualquer coisa assim:
- ... mastiga a ameixa frouxa. Mastiga , mastiga, mastiga: inventa o gosto insípido na boca seca...

(Caio F.In Dispersos)